sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Return of the Living Dead (1985)









A Volta dos Mortos Vivos é um "terrir"?


Seria exato assim denominar um dos filmes de horror mais niilistas dos anos 80, dirigido por Dan O'Bannon (RIP),cineasta e roteirista bastante conhecido pelo roteiro de Alien (Ridley Scott, 1979)?

"Terrir" não parece ser uma boa definição para Volta, apesar do tom de comédia que o toma alguns de seus momentos. Na verdade, a comédia aqui é ácida e amarga. Esse filme tem dimensões trágicas: todos morrem, e o pior de tudo é que dói estar morto.


Freddy (Thom Matthews) sente não a dor de morrer, e sim a de estar morto.


Os eventos se desenrolam às vésperas do maior feriado nacional (e nacionalista) dos Estados Unidos: 4 de Julho, Dia da Independência Americana. É óbvio que situar a narrativa nessa data tem conotações políticas. O Dia da Independência não é somente o dia em que os mortos se libertam de suas sepulturas: ironicamente, é o dia em que cidadãos americanos, que se pensam livres e protegidos por uma Constituição que inspirou os ideais da Revolução Francesa, são bombardeados por seu próprio governo. Uma cidade inteira é destruída por uma bomba nuclear para que as sujeiras de governantes e militares vão para debaixo do tapete, ou melhor, da terra.





"Propriedade das Forças Armadas. Em caso de emergência, ligue..." e seja bombardeado, literalmente.


Os amigos punks de Volta têm razão: todos vão morrer, e o mundo que os cerca é um lixo. Lixo tóxico, lixo político. Os habitantes daquela cidadezinha são tão descartáveis quanto os mortos que se erguem das tumbas.



"No Future": inscrição muito apropriada às portas do Resurrection Cemetery, para onde a turma punk vai zoar e falar sobre morte.




Trash (Linnea Quigley) fantasia sobre a "pior forma de morrer" pouco antes de descobrir, da pior maneira, que não há sensualidade alguma na morte.

Frank e Freddy são os personagens que arrancam risadas no filme, além do cadáver falante ("Braaaaaainnsss!") trancado no porão da Uneeda Medical Supply. Frank (James Karen, o Mr. Teague do primeiro Poltergeist) é um senhor, mas comporta-se como um moleque ao mostrar para Freddy, um jovem curioso, o segredo militar que deveria ser mantido na escuridão daquele subsolo. Gradativamente o riso dá lugar a um terrível desconforto à medida que os dois, algum tempo depois de serem contaminados pela Trioxina (o gás que faz os mortos reviverem), começam a entrar em rigor mortis.



"Mioooooolos!!!!!!" Um morto (Allan Trautman) em uma das poucas sequências engraçadas do filme.

Mais uma pitada de riso amargo: o defunto (John Durbin) pede por mais paramédicos como quem pede pizza.


Some o riso. Um gosto amargo vem à boca especialmente durante o breve interrogatório de um cadáver. "Por que vocês comem cérebros?", pergunta um dos vivos. "Alivia a dor de estar morto", responde o defunto em agonia. Eis uma dimensão que os demais filmes de zumbi (nem mesmo o Night of the Living Dead (1968) de Romero) não contemplou: morrer está longe de ser um alívio na mais plena inconsciência. Dói tanto que só resta aos mortos devorar os miolos dos vivos.


O riso se torna angústia com a revelação desta defunta (Cherry Davis).

Em resumo: A Volta dos Mortos Vivos não é um "terrir". Shawn of the Dead (Edgar Wright, 2004) o é, sem dúvida: as risadas são frequentes e o final é bastante otimista. Em Volta o espaço para risadas é claustrofóbico e o final é arrasador. Aqui a morte é só o começo de mais uma tragédia do corpo: o doloroso e lento apodrecer.

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